quarta-feira, 28 de março de 2012

SER, ESTAR SENDO, TORNAR-SE

Por Dr. Mauro Moore, medico psiquiatra do corpo clinico do

Hospital Israelita Albert Einstein


Marta é tímida, vive recolhida na sua toca, evita qualquer oportunidade de destaque, deixa de assumir o seu verdadeiro tamanho. Júlia é explosiva e critica tudo e todos, tornando-se desagradável e solitária. Ivo luta para estar sempre por cima, sabendo mais, ganhando mais, conhecendo mais gente importante, mas não tem real afeto por ninguém e as pessoas que o cercam não são exatamente seus amigos. Já Rui é muito bonzinho, amigo de todos, está sempre pronto a colaborar, dando muito e não pedindo nada. Por isso, parece sem importância e é deixado de lado.

Aí aparece uma pergunta fascinante: tudo isto é verdade? Eles “são” isso mesmo ou eles “estão sendo” assim, estão habituados a ser assim? Estas são as suas pessoas, de verdade, ou esses são apenas o estilo, o jeito de ser, o padrão a que se habituaram? Afinal, se “são” assim, então não há nada a ser feito, resta conformar-se. Mas, se este é só o padrão, o jeito a que se habituaram, se apenas ‘estão sendo’ assim, então existe a possibilidade de mudança, de evolução, de amadurecimento, de tornar-se, de vir a ser.

A personalidade é o conjunto de padrões de avaliação e de atitudes habituais de uma pessoa. É formada por dois grupos de fatores: o temperamento, vindo da herança genética e manifestado bioquimicamente; e o aprendido, influenciado pelo ambiente, no relacionamento com os pais e os demais familiares, na escola, com os colegas e os professores, e na vida social.

No final da infância e na pré-adolescência os “padrões” da personalidade já estão praticamente definidos. O sistema de avaliação da realidade, a autoavaliação, o conjunto de respostas emocionais e de atitudes frente aos fatos e às pessoas já estão bem delineados. É muito preocupante pensar que somos praticamente aquilo que decidimos ser no fim da infância, com toda a nossa inexperiência e ingenuidade. Tudo isto, padronizado e automatizado, passa a ser o que cada um de nós chama de “eu”.

Uma das principais qualidades do ser humano é a sua incrível capacidade de aprender e padronizar. Aprendemos muito depressa, mas infelizmente padronizamos depressa demais o que foi aprendido. A mudança, a troca de padrões, é feita através de um longo esforço, tanto maior quanto mais intensa a ansiedade que gerou a elaboração de padrões defensivos muito rígidos.

Nós somos organismos vivos, portanto temos a possibilidade permanente de evolução. Está, está sendo, tem sido, contêm a idéia de estado atual, situação que pode ser modificada. A pessoa está gorda e fora de forma, mas pode fazer dieta e exercícios e ficar bem. Aquele padrão hostil adolescente pode ir sendo substituído por novos estilos, mais adultos. Ela, que sempre agiu de modo tímido, pode evoluir, tornar-se mais dona de si e mais assertiva em seus relacionamentos. Ele pode passar a ser mais solidário, cooperador, sem precisar competir e vencer o tempo todo; ganhará serenidade, amizades e colaboração; menor número de taças, talvez, mas com melhor qualidade de champanhe e de companhia.

E como se faz esta modificação de padrões? A evolução é filha do sofrimento e da oportunidade. Assim, o indivíduo que sofre é mais propenso a conseguir mudanças do que aquele cujos padrões não o fazem sofrer, mas apenas despertam sofrimento nos que lhe são próximos. Muitas vezes o convívio com pessoas psicologicamente mais saudáveis são estímulos para a revisão de padrões antigos, desde que estes sejam bem leves. Mas a evolução da personalidade, como a recuperação de qualquer doença, é mais eficaz quando a pessoa busca auxílio especializado, neste caso a psicoterapia.

A meta do tratamento psicoterápico chamado evolutivo ou reconstrutivo é aumentar a liberdade para reavaliar a si próprio, a realidade externa e os outros, possibilitando escolher novamente o seu estilo, estabelecer novos padrões, escolhidos no ‘aqui-e-agora’ e não no ‘lá-e-então’.

Que o passado sirva ao presente, mas não o determine!


Fonte: http://blog.einstein.br/post.aspx?id=202



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